Olhando aos apoios dados pelo Estado à região para colmatar os efeitos da Covid-19, que análise faz desses apoios?
Agradeço, na sua pessoa, ao Jornal VivaDouro a oportunidade concedida de poder dar a conhecer o Movimento “Viticultores Durienses” e alguns projetos que gostaríamos de implementar na Casa do Douro, sem prejuízo de mais adiante apresentarmos mais iniciativas e um manifesto eleitoral.
Começo por reiterar votos de continuação de boa vindima a todos e a cada um dos viticultores durienses, sem constrangimentos de COVID-19 ou acidentes de qualquer natureza, para que possa correr dentro da normalidade possível e em segurança.
Em concreto sobre a questão colocada, todos os apoios do Estado à Região são bem-recebidos.
Contudo, ao que parece, dos montantes disponibilizados para medidas de crise, destilação e armazenamento, para os vinhos Douro – Denominação de Origem Protegida (DOP) e Indicação Geográfica (IG) – apenas 4 milhões de euros vieram para o Douro, não se esgotando todas as verbas disponíveis (sobrando 7 milhões). E para apoio ao Vinho do Porto foi criada a medida de Reserva Qualitativa de 5 milhões de euros que vai permitir beneficiar 10 mil pipas.
Pese todos esses apoios (9 milhões de euros), acontece que até à data desta entrevista ainda não se vislumbrou que esses apoios tenham tido reflexo nos pequenos e médios Viticultores (Viticultores que unicamente produzem uvas). As vindimas decorrem sem preços conhecidos, algo que nos deve envergonhar.
É possível e justo que, com os apoios recebidos do Estado, as cooperativas e os Viticultores que comercializam vinhos, comprando uvas a outros Viticultores, possam manter os preços pago pelas uvas para vinhos Douro, considerando até que a produção este ano se estima menor. E que o preço por pipa de benefício seja aumentado por forma a igualar o rendimento do ano transato, visto que houve um corte de 6.000 pipas de benefício.
Em comparação com outras regiões vitícolas do nosso país, o Douro fica a perder ou a ganhar?
A Região Demarcada do Douro (RDD) ficou claramente a perder. Pois tem especificidades próprias.
A grande maioria dos 20.000 Viticultores na região é considerado pequeno ou médio Viticultor, com mais de 90 % dos mesmos com áreas inferiores a 5 hectares e os apoios foram concedidos às cooperativas e Viticultores que vinificam e que comercializam vinhos, sem o garante que tal se materializava na manutenção de rendimentos dos pequenos e médios Viticultores, e aqui culpo quem tinha a responsabilidade de representar esses Viticultores no Conselho Interprofissional e de garantir esse mesmo rendimento – o que não o fez.
O Rendimento per capita da Região do Douro tem-se mantido abaixo de 60% da média nacional, sendo a Viticultura um dos grandes motores económicos da região. Era necessário diferenciar mais a RDD. Os 7 milhões de euros que não foram esgotados nas medidas de crise, mais os 5 milhões ainda cativos dos sucessivos saldos de gerência do IVDP, podem e devem servir para cobrir prejuízos que os pequenos e médios viticultores terão nesta vindima, considerando até, lamentavelmente, que atualmente o preço recebido pelas uvas não suporta os custos de produção. Aqui fica o repto à Sra. Ministra da Agricultura que encontre forma de fazer chegar diretamente esses montantes às “mãos” dos pequenos e médios Viticultores.
Atento até ao que a RDD representa para o país a nível de receitas com o turismo e exportações.
Falando agora da Casa do Douro, o que motivou a sua candidatura?
Deixe-me relatar com verdade o seguinte: desde tenra idade fui habituado a ajudar nos trabalhos da vinha, em propriedades algumas da família e outras de terceiros que tomávamos conta “de meias”, ou seja, o trabalho era nosso e o rendimento era metade para nós e a outra metade para o proprietário da vinha. Trabalho duro, mas que na altura era compensador. Permitiu aos meus pais criarem os filhos, adquirirem outras propriedades e construírem casa. Sucedendo o mesmo noutras famílias.
Contudo, tudo isso hoje em dia deixou de ser possível com os preços pagos pelas uvas. Aliás, existem várias propriedades na RDD que os proprietários as dispensam para quem queira tomar conta delas, sem qualquer contrapartida financeira, só para não deixar desaparecer o legado da família que tanto “suor e lágrimas” custaram.
O benefício era a maior fonte de rendimento do Viticultor. No ano de 2000 houve autorização para mais de 150.000 pipas de benefício, com preço, na minha terra, ao Viticultor de 1.300 euros e a pipa de consumo a 700 euros. Hoje há autorização para 102.000 pipas de benefício e sem valores por pipa próximos dos praticados.
Porém, desde o ano 2000 a população mundial aumentou mais de 1.500.000 pessoas, potenciais consumidores e desde 2001 a Região Vinhateira do Alto Douro classificada pela UNESCO – condições ótimas para o progresso, mas que não chegou a todos. A título de exemplo, França nestas duas últimas décadas conseguiu duplicar o preço ao produtor.
Assim, face a este quadro, os motivos que me levam a tomar esta decisão prendem-se com a crise que se instalou na RDD, com quase duas décadas. Sinto-me na obrigação moral de ter que contribuir com aqueles que me ajudaram a crescer. Sendo natural de Ervedosa do Douro, Concelho de S. João da Pesqueira, que há vintes anos, era considerada a freguesia mais rica do Douro (por ser a maior produtora do Vinho Generoso), onde hoje muitas pessoas desistiram da viticultura e com vários pequenos e médios Viticultores a não suportarem os custos de produção, quanto mais gerar rendimentos. Infelizmente, esta é a realidade da maior parte do Douro Vinhateiro – empobrecimento.
Urge alterar o atual estado da RDD, pelos Viticultores, pelas nossas famílias e pelo território. Precisamos de devolver a alegria e a vontade de viver aos Viticultores.
Qual deverá ser o papel da CD no futuro da região?
A Casa do Douro de acordo com a lei em vigor não tem as atribuições que já teve no passado, tal não significa que no futuro não as possa vir a ter, se for feito um trabalho de qualidade e de persuasão junto dos decisores políticos, ganhando outras atribuições ou competências.
Por agora, é com base nas atuais atribuições que teremos que trabalhar e cumprindo todas sem exceção. Para não ser maçador e cansativo, e porque adiante apresentaremos um manifesto eleitoral, gostaria de deixar aqui algumas ideias.
Sendo a viticultura um dos principais motores da economia da região queremos que a Casa do Douro seja o centro de gravidade, enquanto representante de todos os Viticultores, para alavancar toda a RDD. Atuando, em síntese, em 3 eixos:
- Eixo 1: “Aumentar o rendimento dos viticultores” (todos sem exceção – mas com especial foco nos pequenos e médios Viticultores), o nosso principal objetivo:
O benefício do Vinho do Porto contribuindo para a maior fatia do rendimento do pequeno e médio Viticultor, assim se queremos aumentar essa “fatia” (que em 20 anos foi reduzido em mais de 33% o n.º de pipas e estimamos em mais de 60 milhões de euros/ano que deixaram de entrar nos bolsos dos pequenos e médios viticultores e logo na região), a saída mais imediata será que a CD tudo faça para que as vendas do vinho do Porto aumentem significativamente em n.º de pipas e, em especial, em valor.
Pois só desta forma haverá mais benefício para atribuir e maior remuneração para mais de 90% dos Viticultores – aqui temos que ponderar uma de varias formas, ou mesmo todas: 1 – pela promoção da “Bebida de Portugal e dos Portugueses”, o Vinho do Porto quer em Portugal e no estrangeiro, um dos nossos maiores embaixadores no mundo, ou 2 – Aumentar o n.º de Viticultores ou União de Viticultores ou Cooperativas que comercializam o Vinho do Porto, há 3 décadas eram mais de 3 dezenas de operadores que faziam exportação e conseguiam escoar bem mais vinho do que atualmente.
Existe outra forma ainda para conseguir isso, sempre na ótica de melhor remunerar os Viticultores, contudo, por agora, fico-me por aqui.
A nível de vinhos Douro (DOC e IG), para aumentar o rendimento, queremos apostar na certificação de todo o Vinho da RDD que para poder ser comercializado terá que ser considerado “certificado” pelo IVDP ou Casa do Douro (sem custos) que cumpre os requisitos de “Desenvolvimento Sustentável” e de “Comércio Justo”, por forma a imputar de facto todos os custos associados desde a produção da uva até ao consumidor final – remunerando justamente pelo seu esforço todos os envolvidos na cadeia de valor, gerando um verdadeiro impacto social e económico na RDD.
Pretendemos, também, criar uma ou mais plataformas online e físicas, de vendas e promoção, que agreguem os vinhos do Douro e Porto, para quem de forma voluntária se queira associar, gerida pela Casa do Douro, gerando melhores preços e melhores margens, com intuito que tal se repercuta no Viticultor.
A aposta está em “vender mais e melhor” os vinhos, com reflexo no preço da uva, logo no Viticultor, e desta forma enriquecer a região e o território.
- Eixo 2: “Gerar o máximo possível de poupança aos viticultores” (também todos sem exceção): pois cerca de 20.000 associados podem e devem ter outra capacidade negocial, através da Casa do Douro, seja na aquisição de “Seguros de colheita e outros”, de serviços de “Higiene e Segurança no Trabalho” ou nos “Fatores de Produção” – pois sabemos bem, por exemplo, o custo do herbicida e do sulfate, etc., etc..
E aqui podemos incluir uma panóplia de serviços técnicos necessários ao viticultor, a preços mais interessantes ou mesmo sem custo, quer prestado diretamente pela CD ou através de entidades ou associações já instaladas na RDD, em parceria.
Mesmo, através de protocolos com diversas entidades, inclusive em áreas não diretamente ligadas à viticultura, gerando poupança aos viticultores.
- Eixo 3: Junto do Governo e de outras entidades públicas (e não só) reivindicarmos todas as medidas possíveis que melhor sirvam os interesses dos viticultores – desde alterações legislativas, redução de impostos, subsídios à viticultura, financiamentos, pagamento de dívidas aos Viticultores, descativação de valores no IVDP, exigir mais e melhor fiscalização, para que se acabe com a introdução de uvas ou mostos na RDD e outras práticas contrárias ao interesse geral dos Viticultores, etc, etc. Neste Eixo, queremos também incluir a recuperação do espólio, vinhos e imóveis que já pertenceram à Casa do Douro para colocar ao serviço dos Viticultores.
Como presidente da CD, como será a relação com o IVDP?
O IVDP como organismo público e face às suas competências, é um parceiro estratégico, pelo que a relação institucional será naturalmente harmoniosa e a melhor possível. Alguns dos nossos projetos terão que envolver o IVDP e partindo dessa premissa, o sucesso do IVDP significa o sucesso da Casa do Douro, logo dos Viticultores. As duas instituições têm que caminhar de braços dados.
E com o comércio?
Deixe-me por as coisas noutro patamar, a Casa do Douro representa todos os Viticultores (conforme a Lei que reinstitucionaliza a Casa do Douro enquanto associação pública), quer os que unicamente produzem uvas, quer os Viticultores que além disso, vinificam e comercializam o vinho, por isso na qualidade de futuro presidente da Casa do Douro, a minha relação com todos os Viticultores será obviamente a melhor possível, na procura das melhores soluções para o interesse geral dos Viticultores. Conforme já referi, o nosso objetivo é o “aumento de rendimento de todos”.
Mas não deixa se ser evidente que a crise instalada no Douro, onde durante anos tem havido “esmagamento de preços”, só nos tem levado ao empobrecimento da maior parte dos Viticultores, e consequentemente da região, com a consequente desertificação da mesma.
É preciso que o preço pago pela uva aumente consideravelmente, é fundamental que quem compra uvas despenda pelo menos o mesmo que gasta a tratar das suas uvas. É também essencial que sejam estabelecidos / contratados os preços antes da Vindima. É inadmissível um Viticultor desconhecer a que preço vai vender as uvas. Ninguém vende vinho sem preço. Existem já boas práticas na RDD de contratos plurianuais, algo a incentivar e a aumentar.
Pegando no exemplo, que recentemente utilizei de que preços de 3.99 euros por uma garrafa de Vinho do Porto na prateleira de um supermercado não são admissíveis: esse valor, descontada a margem da distribuição ou supermercado, do preço da rolha, da garrafa, do rútulo, das taxas e da aguardente e do preço da uva paga ao pequeno e médio Viticultor e vencimentos pouco sobra para o Viticultor que comercializa o Vinho. Ao invés, da diminuição de preços, devemos apostar na subida de preços em todo o setor, associado sempre à melhor qualidade possível dos vinhos, as margens podem ser enormes quer para os pequenos, médios e grandes Viticultores.
Num comparativo entre os candidatos já apresentados, que atributos o destacam dos restantes?
Antes de responder diretamente à questão, tive reuniões e conversações com membros de outras candidaturas ou seus representantes e não obtendo garantias que os seus projetos aumentariam os rendimentos dos Viticultores e, nalguns casos, não oferecerem garantias de uma gestão isenta ou nem demonstrarem vontade de servir os Viticultores, sentimos a necessidade de avançar com uma candidatura. E o facto de mais de uma candidatura me propor para não avançar ou ainda me solicitarem para me juntar à sua candidatura, é porque os oponentes consideram-me estar à altura do desafio.
Relativamente à pergunta, estou habituado, até pela minha atividade profissional principal, Oficial da Guarda Nacional Republicana, a servir os outros, a gerir pessoas, orçamentos e recursos, a dirigir serviços – tudo que terá que ser feito pelo futuro presidente da Casa do Douro.
Durante cerca de uma década estive ligado a funções de Dirigente Associativo (neste caso, associativismo militar), exigindo melhores condições para as pessoas, onde muitas das minhas funções passavam por reuniões ao mais alto nível junto do Governo e outras entidades, e trabalhar em dossiers complexos, sempre na procura de alinhar interesses.
Por isso, sinto-me com capacidade para poder servir os Viticultores.
Podem os Viticultores contar comigo para “contas certas”, aliás esta é uma das minhas linhas vermelhas, a outra é não me submeter a interesses corporativistas que não seja o melhor interesse dos Viticultores Durienses.
Considerando, ainda, que a Casa do Douro é uma associação pública, sujeita a regras próprias, de acordo com algum funcionalismo público, nenhum dos candidatos tem a experiência nessa área que eu tenho.
É apontado como o candidato novo que vem de fora das lógicas associativas habituais o que causa apreensão aos habituais intervenientes. Sente-se capaz para ocupar o cargo?
Já no passado, em momentos de crise foram chamados militares à Direção da Casa do Douro: entre outros dou-lhe os seguintes exemplos: logo a primeira direção em 1932 contava, com 3 militares, 1 major e 2 capitães, em 1949 houve um tenente-coronel, aliás o mesmo posto que detenho, no pós-25 de abril, novamente um militar de posto de capitão – ou seja não é inédito.
Eu sou natural da região, toda a minha família é natural da região, desde pequenino que fui habituado a trabalhar na viticultura e é uma questão que me diz muito.
Quem já está, de acordo com a sua definição de “lógicas associativas”, e acredito que se refira à Federação Renovação Douro e à Associação da Lavoura Duriense em concreto, que também manifestaram ir a eleições, deixam muito a desejar.
A primeira que deveria representar todos os Viticultores, que supostamente terá 3 mil associados, contudo só nos tem feito perder milhões de euros dos bolsos dos pequenos e médios viticultores. A Segunda que alega representar 15 mil viticultores, pergunte a algum deles se já alguma vez recebeu sequer um “rebuçado” dessa mesma associação, temo que ainda teria feito pior.
Acho que tenho as condições necessárias para assumir a função de Presidente da Casa do Douro.