Setembro é mês de início de mais um ano letivo. Para aqueles que iniciam o seu trajeto escolar ou um novo ciclo é sempre altura de algum nervosismo, para os que regressam para junto dos seus colegas é tempo de matar algumas saudades que as férias provocaram. Este ano, devido à pandemia Covid-19 este é um momento que será vivido de forma diferente e o VivaDouro visitou duas escolas da região para perceber como é que tudo está a ser preparado para receber os alunos.
Nas Escola Secundária de Latino Coelho, em Lamego, o regresso dos cerca de 800 alunos à escola está planeado para o dia 17 de setembro.
Para o diretor do agrupamento escolar, o professor Martins Rocha, tudo está pronto para esse momento com alguns ajustamentos já planeados, em especial no que diz respeito aos horários das aulas e às salas que têm capacidade para receber alunos com as devidas condições.
“O que está planeado é o ensino presencial, com ajustamento de horários e algumas opções em termos de mancha horária tentando fazer com que os alunos fiquem menos tempo na escola mas também com menos espaço livre, como se costuma dizer.
Houve um reajustamento nos horários de funcionamento, a criação de 6 tempos de manhã para permitir mais aulas concentradas neste turno e depois uma seleção de salas onde os alunos podem estar com as condições de afastamento que são recomendadas pela DGS. No fundo estamos a seguir todas as instruções da DGS e desde o pré-escolar foram feitos os necessários ajustamentos.
Nós temos salas grandes e pequenas, em algumas das pequenas não há condições portanto não serão utilizadas a não ser por grupos reduzidos de alunos.
A questão de funcionamento em si, não é complicado quando os alunos estão nas aulas, o complicado é quando eles saem das aulas, nos espaços comuns, essa é a parte que está a dar mais trabalho em termos de organização de circuitos por onde eles podem andar porque temos que jogar com várias coisas, ter os alunos permanentemente fechados numa sala aumenta a probabilidade de conflitos”.
Para o diretor, a manutenção dos alunos dentro da sala de aula durante o período da aula e o intervalo é mesmo o mais difícil de gerir, por isso foram já dadas indicações aos docentes para adaptarem os momentos de aula à nova realidade.
“Já foram dadas algumas orientações para os diretores de turma durante a semana anterior no sentido de estabelecer um plano de atuação que mais do que fazer a identificação das dificuldades, dos atrasos e dos avanços, relativamente ao período em que estiveram à distância têm efetivamente alguma orientação na gestão de pausas no decurso das aulas para descontrair e captar a atenção.
Os ajustamentos passam efetivamente por juntar duas aulas seguidas num bloco e depois um intervalo de 10 minutos, que é pouco, mas que é o que é possível e em seguida mais duas aulas, intervalo, e novo bloco. Cada bloco corresponde a 100 minutos dentro da sala de aula, regra geral com o mesmo professor salvo raras exceções.
Esses 100 minutos de aula são obviamente complicados no contexto atual, não o seriam num contexto normal onde se poderiam fazer atividades diversas mas agora temos que ter um ensino moderno numa escola organizada à moda antiga com todos virados para o mesmo lado sem abertura para movimentações dentro da sala”.
Com vários anos de experiência o diretor confessa que existe alguma apreensão entre o corpo docente, apesar de existir já alguma experiência ganha com o regresso às aulas de alguns alunos em julho, após o período de confinamento.
“É obvio que já passamos essa experiência quando no ano passado regressaram os 11os e 12os anos, havendo uma adaptação a este novo ensino presencial. Houve cuidados, há consciência do corpo docente de que vivemos uma situação de risco e que sistematicamente vamos alertar os alunos para que tenham os comportamentos e atitudes adequados ao tempo que vivemos.
Quando começarmos as aulas não iremos ter cá nenhum vírus dentro, mas ele pode entrar e temos que saber lidar com a situação de forma tranquila seguindo as indicações da DGS.
De uma maneira geral toda a gente está apreensiva com a situação mas penso que vai tudo querer andar para a frente e pôr o país a mexer”.
Em Lamego tudo está preparado para o ensino presencial, contudo, toda a reestruturação de horários e funcionamento foram feitos já a pensar num possível regresso ao ensino à distância.
“Tudo isto passou por uma reestruturação e reorganização das próprias aulas que maioritariamente vão ser feitas em blocos de 2 aulas, os tais 100 minutos, o que permite uma passagem da situação do presencial para o ensino à distância mantendo os mesmos horários, correspondendo a primeira hora a trabalho síncrono e a segunda a trabalho autónomo dos alunos.
Os horários terão certamente acertos mas que serão pontuais, ou seja, de um dia para o outro saberemos que horários iremos ter porque será o mesmo do presencial. Essa foi a estratégia simples mas que está a dar muito trabalho na construção desses horários.
Também nesta estratégia temos no nosso plano de atuação, para além daquilo que eu disse, os professores utilizarem os recursos tecnológicos ao seu alcance no ensino presencial, fazendo com que essa utilização permita capacitar melhor os alunos para o trabalho digital com as plataformas. Se todos os professores fizerem esse trabalho na sala de aula, se for necessário passar ao ensino à distância, já vão saber quais são as capacidades e as dificuldades dos alunos. Aqueles que tenham mais dificuldades em acompanhar passarão certamente para o grupo que vai ficar na escola”.
No concelho vizinho, Peso da Régua, no Agrupamento de Escolas Dr. João de Araújo Correia, o diretor Salvador Ferreira garante que tudo está já planeado para receber os cerca de 2000 alunos que frequentam a escola secundária.
“Nós temos um plano, um “guia de utilização” para cada um dos espaços, cantina, pavilhão desportivo, biblioteca, etc, contudo a sua aplicação pode depois ser alterada mediante a realidade, porque não sabemos se teremos essa capacidade no que diz respeito aos assistentes operacionais. Fizemos um trabalho de preparação muito intenso mas tudo pode mudar quando for aplicado à realidade do dia a dia”.
As mudanças a que o diretor se refere podem surgir, em especial pela falta de pessoal não docente que, segundo diz, é in suficiente para todo o trabalho e vigilância que este tempo obriga.
“Nós temos 28 funcionários, 3 já estão de baixa de longa duração. Dizem que temos o rácio mais elevado do que devíamos ter mas na verdade o rácio é apenas um estado de espírito porque para que tudo funcionasse bem, neste momento, precisávamos de mais funcionários, até porque, muitos dos que temos já têm alguma idade, apenas 2 ou 3 têm menos de 50 anos, o que é penalizante, e alguns deles estão mesmo enquadrados nos grupos de risco devido às doenças que têm. Vamos ver se conseguimos equilibrar as coisas e temos apelados a esses funcionários que tenham o máximo cuidado na sua vida pessoal, fazendo um esforço porque este é um ano excecional. O mesmo acontece com os professores, muitos deles têm mais de 60 anos”.
Para este regresso uma das principais preocupações está relacionada com os momentos que podem resultar em ajuntamentos, as refeições e os intervalos, por isso foram também pensados ao pormenor.
“Aqui na secundária a medida que conseguimos implementar melhor, até porque as nossas turmas em média não ultrapassam os 22 alunos, é a distância dentro da sala de aula, onde conseguimos mesmo que seja maior do que a recomendada. Cada sala está destinada a uma turma, para evitar que haja muitas deslocações dentro da escola. Garantimos também uma maior distância entre a primeira fila de carteiras e o quadro, que normalmente é superior a dois metros para que o professor se possa descolar nessa zona sem problemas.
Na cantina vamos utilizar um sistema de cores, azul e laranja, os alunos depois de percorrerem o trajeto até pegarem a sua refeição desinfetam e lavam as mãos, depois, já com o tabuleiro vão-se sentar nas cadeiras assinaladas com uma cor, ficando todos virados para o mesmo lado. Quando o aluno da cadeira azul termina a refeição o aluno seguinte senta-se na cadeira laranja que está virada no sentido contrário e um funcionário desinfeta a área azul que esteve em utilização.
Seguindo sempre as regras da boa alimentação vamos também este ano tentar fazer refeições mais simples evitando assim que sejam necessários muitos funcionários na cozinha, podendo aloca-los a outros serviços. Desta forma os alunos também farão a sua refeição de forma mais rápida.
O bar vai estar encerrado para evitar aí aglomerações, algo que estamos a pensar é fazer uns “kits” que os alunos podem adquirir por exemplo com uma peça de fruta, uma sanduíche e uma bebida.
Há uma situação que nos preocupa e que a decisão ainda está em aberto que é a questão dos intervalos. De forma a prevenir problemas maiores em termos de segurança, na construção de horários criamos um desfasamento, por exemplo, num dos pavilhões, metade das turmas começam as aulas às 08:50 e as restantes às 09:05, isto irá fazer com que os intervalos ocorram em momentos diferentes, bem como a pausa para o almoço.
Nós temos aqui um pavilhão, por exemplo, que só nele estarão 400 alunos, mais do que no total de muitas escolas que por aí existem. Se as coisas começarem a correr mal teremos que ser obrigados a manter os alunos dentro das salas durante os intervalos mas essa não é a nossa opção inicial. As idas à casa de banho também serão desaconselhadas durante o intervalo, porque não teremos capacidade de garantir que não vão em grupo, portanto essas idas irão acontecer mais durante o tempo de aula. Obviamente que isto irá gerar algum descontentamento nos professores mas é a melhor forma de garantirmos a segurança”.
Salvador Ferreira está consciente que “os pais estão preocupados”. De forma a minimizar esse sentimento “as equipas que elaboraram os planos de utilização dos espaços foram também constituídas por um elemento da associação de pais, permitindo assim que haja um maior envolvimento deles o que também gera confiança”.
Apesar de todos os cuidados o diretor afirma que “a partir deste momento temos a consciência que vão surgir casos. Temos um plano de contingência preparado exatamente para essa situação. Aquilo que esperamos é que, assim que os pais em casa se apercebam de qualquer sinal, que eles próprios tomem a iniciativa de não trazer os seus filhos. Se os casos forem detetados dentro de alguma das nossas escolas estamos preparados para isso.
O que apelamos é que os alunos se controlem uns aos outros, não de uma forma negativa mas para prevenir algum problema. De alguma forma todos nos achamos intocáveis mas se nos defendermos a nós vamos defender todos à nossa volta. Os jovens hoje têm uma visão às vezes rebelde sobre o excesso de normas mas neste caso acho que eles próprios também querem regras porque no fundo eles próprios também têm preocupações com esta situação, eles não são imunes às notícias que nos chegam todos os dias”.
Na azáfama da escola anda também Vânia Santos, acompanhada pela filha Maria, que este ano vem estudar para Portugal após regressar da Bélgica onde esteve emigrada.
Maria confessa-se “apreensiva” com esta nova etapa e num comparativo com a experiência vivida em Bruxelas afirma à nossa reportagem que “aqui notam-se menos cuidados. Na bélgica há um maior cuidado. Lá as pessoas usam máscara na rua, não se encostam nos balcões dos cafés, por exemplo, isso aqui não acontece, há muito mais cuidado”.
Vânia confessa que a filha “não queria vir estudar para Portugal” mas, apesar de notar “menos cuidado por parte das pessoas” afirma estar “tranquila com esta nova etapa” até porque, afirma, “ela também terá o máximo cuidado”.