Por Emídio Gomes, Prof. Catedrático da UP e Presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte
Não há semana, por vezes dias consecutivos, em que não sejamos sacudidos por notícias relativas a mais uma tragédia humana que atinge os que tentam de forma desesperada chegar à Europa, fugindo à fome, à guerra e às condições miseráveis e de absoluta indignidade humana em que têm vivido. O drama entra-nos pela porta dentro com imagens incríveis, em que idosos misturados com crianças se deixam transportar em condições que colocam em risco total as suas vidas.
Tudo isto ocorre no mesmo espaço territorial onde diariamente se cruzam centenas de navios de cruzeiros que transportam pessoas em férias, que provavelmente em muitos casos se terão cruzado com os botes sobrelotados que navegam não se sabe bem para onde.
Perante este drama, o que faz a União europeia? Discute quotas de acolhimento com o estatuto de refugiados, sendo que aqui há mesmo distinção em função da origem dos migrantes. O cenário da ilha de Kos, na Grécia, onde a luta pela sobrevivência leva a cenários de violência entre os que chegaram com vida ao acampamento provisório instalado num antigo campo de futebol, ultrapassa tudo o que é admissível.
Perante isto assobiamos para lado como se tudo estivesse suficientemente longe de nos tocar. Não aceito esta situação. Até porque tenho memória de uma Europa que, ainda em 1982, deteve durante horas, na fronteira de Hendaye, um grupo de estudantes portugueses de que eu fazia parte e se dirigia em visita à feira de agricultura em Paris, com absoluto desdém e mau trato, apenas e só porque não acreditavam que o nosso único objetivo não fosse a emigração ilegal. Não passou assim tanto tempo, apenas mudaram os tempos!
Acredito numa Europa que, apesar da necessária disciplina das finanças públicas de que sou defensor, não deixa de ser um espaço solidário, onde cada pessoa é um valor sagrado enquanto tal. Se necessário, sacrifique-se uma percentagem simbólica do Horizonte 2020, ou do orçamento dos fundos estruturais. Mas nunca, em caso algum, se assista a esta situação dramática do Mediterrâneo, sem perceber que ela é um problema nosso enquanto cidadãos do mundo e, apesar de tudo, de um espaço privilegiado.